Prefeituras e bancos precisam aprender a tratar de forma diferenciada os trabalhadores que estão deixando a informalidade a apostando nos benefícios do Empreendedor Individual, a figura jurídica criada para acolher microempreendimentos, com faturamento até R$ 60 mil, e que estão ainda engatinhando no universo corporativo. Para o diretor-presidente do Sebrae, Luiz Barretto, 49 anos, sociólogo formado pela PUC-SP e com mestrado em ciências políticas, o Brasil passa por grande transformação, um momento em que desperta para a relevância desse segmento da economia, ao mesmo tempo em que tentar descobrir a melhor maneira de torná-lo eficiente e produtivo. Nesta entrevista ao Valor, concedida durante o Fórum Sebrae de Conhecimento, em Brasília, Barretto falou sobre os principais desafios dos técnicos da instituição que comanda - um orçamento invejável previsto para R$ 2,3 bilhões para 2012 e defendeu a criação de um ministério para canalizar as demandas do setor. Valor: O Sebrae está avaliando algumas ferramentas para ter uma ação mais efetiva no dia a dia das micro e pequenas empresas, com objetivo de promover inovação, em especial para quem não dispõe de conhecimento nessa área. O que há de novo nessa área? Luiz Barretto: O Sebrae vai fazer 40 anos em 2012 e não é tão fácil ser uma instituição que perdura por todo esse tempo. Aprendemos a separar bem a nossa clientela e as suas especificidades. Por exemplo, temos um público novo que se criou a partir da legislação do Super Simples, que é o Microempreendedor Individual, outra experiência vitoriosa no Brasil. Nós formalizamos, em menos de dois anos, quase 1,8 milhão de trabalhadores. Isso significa ganhar direitos, benefícios, como os da previdência, cidadania empresarial, ter um CNPJ, poder emitir uma nota, ter um financiamento como pessoa jurídica, enfim, ter acesso a uma série de outros mercados. É um desafio para o Sebrae entender esse novo público, que não existia até dois anos atrás. Realizamos uma grande pesquisa para entender quem são essas pessoas, que aspirações elas têm, que profissões têm. Uma das conclusões é que 59% já tinham um negócio. Valor: Que outras conclusões interessantes vocês encontraram? Barretto: A gente imaginava que o principal motivo da formalização fossem os benefícios, a previdência e o CNPJ, e isso não foi constatado. O principal desejo dessas pessoas é ser dono do seu próprio negócio, poder crescer. Evidentemente os benefícios também pesaram, mas o foco é se tornar capitalista e poder crescer. Este público é diferenciado, não é habitual do Sebrae, não tem experiência de relação com os bancos. Não está afeito a cursos e treinamentos, e precisamos aprender a abordá-lo, a fazer com que ele seja sustentável no longo prazo. O desafio é não só continuar aumentando o grau de formalização - a gente está projetando chegar a 2,5 milhões no ano que vem - mas não permitir que esses negócios voltem para a informalidade. Valor: Qual o grau de entendimento que esses novos empreendedores têm sobre conceitos como a sustentabilidade de um negócio? Barretto: Essas pessoas vivem no mundo prático, é uma vida focada no empirismo, eles têm um grau de sobrevivência grande. Quando ele se formaliza, a agenda muda. A concorrência aumenta e os ganhos que ele tinha na informalidade deixam de acontecer. Mas os benefícios são muitos, eles ampliam seus mercados porque agora podem ter financiamento, podem vender para grandes empresas e governos. Valor: E qual é a abordagem da Sebrae para trazer essas pessoas para o mundo da inovação? Barretto: Depois de um diagnóstico inicial para saber quem é esse público, nós entendemos que eles têm que ser abordados, não só pelo mecanismo tradicional, mas por meio de uma busca ativa. A gente não pode ficar esperando que esse cliente venha ao Sebrae, inclusive porque ele não tem condições para isso. Valor: Nem tempo. Barretto: Nem tempo. Ele não pode fechar a porta do negócio para ir a um balcão do Sebrae. Como fazê-lo entender que a sobrevivência dele depende de novos fatores, que o mercado é muito mais concorrencial. A inovação pega todo mundo, ele precisa ter um bom plano de negócios. Mas como fazê-lo entender tudo isso? Não pode ser do jeito tradicional. Por isso estamos fazendo oficinas práticas nas comunidades e desenvolvendo soluções. Por exemplo, mensagens pelo celular. Essa pesquisa sobre a base da pirâmide, este que fatura até R$ 60 mil por ano e que acabou de deixar a informalidade, mostra que muitos não têm endereço próprio, mas uma coisa todos têm - o celular. Então, o celular deve ser a forma de alcançar essas pessoas. Evidentemente você não pode dar um curso longo pelo celular, mas pode dar dicas, avisos como hoje vence o prazo para pagar tal imposto. Além disso, criamos uma rede SEI - Sebrae Empreendedor Individual - com sete soluções específicas para este público, que vão ser trabalhadas nas comunidades, nas oficinas e nos cursos. Os cursos on-line vão continuar disponíveis, mas o que quero dizer é que precisamos ir além das questões tradicionais para atender um público que é muito diferente. Valor: Uma das maiores queixas dos microempresários é quanto à dificuldade de acesso a crédito. Existe uma expectativa de haver um tratamento diferenciado para esse novo público? Barretto: Ninguém sobrevive sem crédito. Da mesma forma que é um desafio para o Sebrae fazer a capacitação desse público, o sistema bancário tem que entender essa lógica. Estou feliz que os bancos federais estão ensaiando o microcrédito para esse segmento. Mas há uma terceira questão muito importante, que é o poder público municipal. Estamos falando de gente que não tem a cultura da formalidade. Ele não pode ser tratado o empreendedor de muitos anos. Por exemplo, no Rio de janeiro, vivemos um momento de reconquista da Rocinha. A Rocinha é um dos espaços mais empreendedores do Rio. Calcula-se que haja 6 a 7 mil pequenos negócios na comunidade, mais de 90% deles informais. O Sebrae vai fazer um trabalho ali e muitos podem se formalizar. Para que eles possam se desenvolver, a formalidade tem que ser um ganho. E a postura municipal deve ser diferente. A prefeitura tem que ter um olhar especial para a Rocinha, não pode ser o mesmo que dá para Ipanema. Eu não posso cobrar da dona Maria que acabou de abrir uma pastelaria na Rocinha a mesma postura que um microempreendedor da zona sul. Valor: Diante de tantos avanços no ambiente legal, nas medidas de gestão e práticas para atingir esse público, será que é mesmo necessário ter um Ministério da Micro e Pequena Empresa? Barretto: Sim. A gente precisa ter uma porta de entrada única no governo, um órgão único que possa o tempo todo, full time, ser aquela pessoa que batalha pelo tema da pequena empresa. Por exemplo, surge uma lei específica sobre mercado automotivo - tem que ter alguém que pense o que isso tem a ver com a pequena empresa, com a cadeia de autopeças etc. Ou uma questão trabalhista, você precisa de alguém que catalise políticas públicas e uma entrada única para esse assunto, que hoje é muito disperso. | |
Fonte: Valor Econômico |
quarta-feira, 23 de novembro de 2011
Celular é estratégia para ser mais eficiente
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